A Lava Jato nunca esteve tão perto dos grandes bancos. É o que
sugerem os sinais que vêm se acumulando nas últimas semanas.
1. Delação de Palocci
Antonio Palocci está negociando um acordo de delação
premiada com a força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal, em
Curitiba. E indicou que pode entregar ilícitos do setor financeiro em troca de
um alívio em sua eventual pena.
Ministro da Fazenda no governo Lula e da Casa Civil na gestão de Dilma
Rousseff, Palocci foi uma das principais pontes entre o PT e o mercado
financeiro. Fora do governo, prestou consultoria a Itaú, Bradesco, Santander e
BTG Pactual. E conhece como poucos os meandros dos negócios entre grandes
bancos do país.
Em depoimento ao juiz federal Sergio Moro, Palocci sinalizou que pode
tratar de temas que envolvam o setor financeiro e entregar ao menos um
banqueiro. Declarou que, “em sigilo”, poderia contar quem foi a “grande
personalidade do meio financeiro”, que o procurou para “capitalizar” a
“provisão de R$ 200 milhões da Odebrecht ao PT”.
2. Delação de Funaro
Outra delação que causa calafrios no setor financeiro é a
do doleiro Lúcio Funaro, acusado de ser o operador financeiro do ex-deputado
Eduardo Cunha (PMDB). Ele seria responsável por estruturar complexas operações
financeiras para ocultar desvios de recursos públicos e pagar propinas a
políticos, em especial ligados ao PMDB.
3. Doações eleitorais
A exemplo das empreiteiras, os bancos são grandes doadores
de campanhas políticas. Eles doaram mais de R$ 200 milhões ao “caixa 1” das
campanhas eleitorais de 2014, na soma do dinheiro que foi entregue a partidos e
candidatos a presidente da República, governador, senador e deputado federal e
estadual.
A Lava Jato, como se sabe, sustenta que muitas doações declaradas ao
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) escondem, por trás da aparência de
legalidade, o pagamento de propinas a políticos.
Pode não ser o caso dos bancos. Mas não deixa de chamar atenção a
influência que grandes doadores parecem ter sobre o governo. Para ficar num
exemplo: Joaquim Levy, ministro da Fazenda nomeado por Dilma após sua
reeleição, era executivo do Bradesco e foi indicado para o cargo pelo
presidente do banco, Luiz Carlos Trabuco – isso depois que o próprio Trabuco
declinou do convite.
4. MP da leniência
Bem quando começaram a ficar mais fortes os rumores de que
Palocci e Funaro fariam delação premiada, o presidente Michel Temer assinou, no
último dia 8, uma medida provisória (MP) que autoriza o Banco Central e a
Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a fechar acordo de leniência – espécie de
colaboração premiada de empresas – com instituições bancárias.
A MP 784 multiplicou as multas que os dois órgãos podem aplicar. Elas
saltaram de R$ 500 mil para R$ 500 milhões no caso da CVM e de R$ 250 mil para
R$ 2 bilhões no caso do BC. Além disso, a leniência abrange apenas infrações
administrativas – ou seja, o banco não fica livre de ser processado, na esfera
criminal, pelo Ministério Público.
Mesmo assim, o momento em que a medida provisória foi publicada chamou
atenção. As novas normas, que enquadram o Brasil em padrões internacionais de
governança bancária, descansavam na mesa da presidência da República desde
2015. E, de repente, ganharam força de legislação por meio de MP – que entra
imediatamente em vigor – em vez de serem analisadas com mais cuidado pelo
Congresso, na forma de projeto de lei.
5. A fala do procurador
O procurador regional da República Carlos Fernando dos
Santos Lima, membro da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, fez duras
críticas à medida provisória da leniência. Defendeu que o tema deveria ser
regido por projeto de lei e insinuou que a urgência que o governo viu em
regulamentar a leniência – a ponto de editar uma medida provisória – pode ter a
ver com a necessidade de resolver um “problema específico”.
"A medida provisória foi editada em meio aos desdobramentos da Lava
Jato que parecem chegar mais perto do mundo econômico”, disse Lima. "
O Ministério Público havia reagido de forma parecida em 2015, ao atacar
a possibilidade de que empresas pudessem fechar acordos de leniência apenas com
a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Conselho Administrativo de Defesa da
Concorrência (Cade). Os órgãos se entenderam e, pouco depois, grandes
empreiteiras passaram a colaborar com a Lava Jato.
6. Bancos ‘assuntando’ com a força-tarefa
Outro indício de que a Lava Jato está na cola do sistema
financeiro é que a força-tarefa teria sido procurada por bancos interessados em
relatar irregularidades. Segundo o jornal Valor Econômico, as instituições
buscam informações sobre as regras e condições dos acordos de leniência do MP.
A hipótese é de que elas querem, à la JBS, se antecipar a possíveis revelações
de delatores.
7. Participação na Sete
Brasil Uma das empresas desmascaradas pela Lava Jato é a
Sete Brasil, criada para gerenciar a construção de sondas para o pré-sal – ou,
segundo o Ministério Público Federal, para ajudar na corrupção. A companhia,
que está em recuperação judicial, foi fundada em 2010 por um consórcio de
fundos de pensão de estatais, fundos e empresas de investimentos e... bancos.
BTG Pactual, Santander e Bradesco são sócios da empresa, e ajudaram a
financiá-la junto com Banco do Brasil, Itaú e Caixa. Ou seja, de uma forma ou
de outra os principais bancos do país têm envolvimento com a Sete Brasil – o
que eventualmente pode virar um problema do ponto de vista criminal.
Financeiramente, a empresa foi um desastre: recebeu empréstimos de US$
3,6 bilhões e deve mais de US$ 5 bilhões. E, se tanto, entregará à Petrobras
apenas quatro das 28 sondas planejadas inicialmente.
8. De onde vem tanto dinheiro?
Com tanto dinheiro de propina circulando por aí, até em
malas, é de se perguntar se nenhuma instituição financeira facilitou as coisas.
Foi assim no mensalão, quando o dinheiro sujo era sacado na boca do caixa de
uma agência do banco Rural, em Brasília.
“De onde vem todo esse dinheiro? Direto da Casa da Moeda é que não.
Também não cai do céu. Para fechar o circuito da Lava Jato, tem que passar pelo
mercado financeiro”, diz um especialista no setor bancário. “Toda movimentação
acima de R$ 10 mil, qualquer saque, precisa ser informado ao Coaf [Conselho de
Controle de Atividades Financeiras]. Será que os bancos avisaram?”
A Lava Jato já está de olho nisso. Ainda em 2014, Luccas Pace Junior,
assistente da doleira Nelma Kodama, disse ao juiz Sergio Moro que bancos eram
coniventes com operações de lavagem de dinheiro. A operação também investiga
qual foi o papel de um grupo de bancos médios e grandes em crimes financeiros
envolvendo contratos de US$ 15 bilhões entre a Petrobras e o grupo Schahin.