Num
momento como o que estamos vivendo, o trabalhador só tem desvantagens, porque
as negociações são feitas sob ameaças que comprometem sua existência digna.
Assim, para garantir o emprego, o trabalhador ou trabalhadora vai ter de abrir
mão de direitos acessórios, porque se não abrir, perde o principal, o emprego!
Marcos
Verlaine*
Dando
continuidade ao debate em torno da proposta de “reforma” trabalhista do
governo, consubstanciado no PL 6.787/16, é preciso que se diga: o projeto é
desnecessário! É inoportuno! Porque propõe como soluções para a crise do
desemprego fórmulas testadas e desaprovadas aqui e lá fora. E sob conjuntura
econômica que degrada o trabalhador e principalmente a trabalhadora!
O
projeto é uma demanda do mercado, que embora saiba que para gerar emprego é
preciso investimentos para fazer a economia voltar a crescer para o Brasil
voltar a se desenvolver; mas, propõe restrições e retrocessos, porque, ao fim e
ao cabo, quer maximizar seus lucros, sem amarras que lhe imponha regramentos e
restrições para tal intento.
A
proposta do governo, por demanda do mercado, é rejeitada pelo Ministério
Público do Trabalho, que recomenda-lhe rejeição parcial e ajustes. Então vamos
ao contencioso.
Fundado
na ideia que a CLT é “velha”, não oferece “segurança jurídica” e não ajuda a
“melhorar o ambiente de negócios”, os empresários, há décadas propõem a
extinção da legislação trabalhista. Mas não diz que a “velha” septuagenária CLT
está recauchutadinha, já foi atualizada em 85% do seu texto. Está
rejuvenescida! Está atualizada!
A CLT,
de fato, não dá “segurança jurídica” para fazer o querem: demitir sem custo,
contratar precariamente, esgaçar a mão de obra com jornadas escorchantes, sem
segurança, e outros acessórios importantes para o bem-estar do trabalhador ou trabalhadora.
A segurança jurídica que quer o mercado é a insegurança jurídica dos
trabalhadores. A “melhoria do ambiente de negócios” é o eufemismo utilizado
para dizer que querem a desregulamentação total das relações de trabalho.
Regime
parcial
Mas vamos a outros aspectos do projeto. O trabalho em regime parcial, que hoje
é de 25 horas, a proposta é aumentar para 30 horas, e mais 26 de horas extras.
Ora,
se o empregador, pelo projeto, poderá empregar um parcial em regime quase
integral, e pagando salário de parcial, por que contratar um trabalhador em
regime integral?
Trabalho
temporário
O contrato de trabalho temporário dura hoje 90 dias, prorrogáveis por mais 90,
e o projeto amplia para 120, prorrogáveis por mais 120. Seriam oito meses de
temporariedade. A mudança, segundo o governo, se faz necessária “motivada pela
alteração sazonal na demanda por produtos e serviços”. Aqui o MPT vê dois
problemas. A “ocorrência da alteração sazonal faz parte do risco do negócio e
admiti-la como justificativa para a contratação de trabalhador temporário é
transferir o ônus do empreendimento para o trabalhador, tendo em vista que se
trata de contrato de trabalho que prevê patamar de proteção inferior ao
contrato por prazo indeterminado. Além disso, haverá dificuldade em se
conceituar sazonalidade para a caracterização do contrato temporário, o que irá
gerar insegurança jurídica”.
No que
diz respeito à ampliação do prazo de 90 para 120 dias, “não se apresenta
qualquer justificativa para embasar a alteração”, diz o MPT. “Contudo, em razão
de ser uma espécie contratual que estabelece um rol menor de direitos aos
trabalhadores, conclui-se que a extensão das possibilidades de utilização
causará prejuízo aos trabalhadores”.
E
completa: “os contratos temporários, juntamente com os contratos por tempo
parcial, tiveram na Europa e nos Estados Unidos enorme avanço após a crise
econômica de 2008 e hoje organismos internacionais e os próprios governos
nacionais reconhecem que o fenômeno se revelou socialmente nocivo, tendo
produzido um aumento vertiginoso da desigualdade econômica e social”.
Inoportunidade
da “reforma”
Mas há outros aspectos negativos no projeto. Não apenas no texto em si, mas
também em relação ao momento em que foi apresentado. Numa conjuntura de
depressão econômica e desemprego galopante, que obriga os trabalhadores a
fazerem uma disputa injusta e desigual com o capital, semelhante àquela que se
faz da “adaga contra o pescoço” ou aquela clássica, em que a “raposa é colocada
para tomar conta do galinheiro”.
Dizer,
por exemplo, como os empresários dizem, matreiramente, que a livre negociação
entre patrões e empregados seria mais vantajosa que a legislação trabalhista é
de uma desonestidade cretina!
Num
momento como o que estamos vivendo, o trabalhador só tem desvantagens, porque
as negociações são feitas sob ameaças que comprometem sua existência digna. Assim,
para garantir o emprego, o trabalhador ou trabalhadora vai ter de abrir mão de
direitos acessórios, porque se não abrir, perde o principal, o emprego!
Por
isso, o “império da lei” é fundamental para o trabalhador, pois só a lei pode
salvar o trabalhador da sanha pelo lucro incessante e a todo custo. Como diz o
deputado Robinson Almeida (PT-BA), membro da comissão especial que discute o PL
6.787/16, “Nos conflitos entre capital e trabalho, o Estado, por meio das leis,
deve garantir empregos decentes, como proclama a Organização Internacional do
Trabalho (OIT).”
E
acrescenta: “Por isso, a Constituição prevê acordo coletivo só para os casos de
ampliação de direitos ou quando haja condições para soluções justas e
equilibradas”, como determina o artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição de
1988.
Assim,
por tudo isto e mais alguma coisa, não há como não dizer que a reforma
trabalhista é tão ruim quanto a previdenciária.
(*)
Jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap