O Bradesco foi condenado pela Justiça do Trabalho
do Rio Grande do Sul a pagar uma indenização de R$ 800 milhões ao Fundo de
Amparo ao Trabalhador por dispensa discriminatória e sonegação de valores a
empregados.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho,
autor da ação civil pública que originou a condenação, a empresa demitiu dois
irmãos que trabalhavam em diferentes agências do banco, no mesmo dia, em
represália pelo pai deles, um ex-gerente do banco, ter entrado com uma
reclamação trabalhista contra o Bradesco. As demissões, segundo a decisão
judicial, violaram o direito fundamental de um cidadão ter livre acesso ao
Judiciário sem temer represálias e, portanto, atingiram não apenas indivÃduos,
mas a coletividade.
Além da indenização, o procurador do trabalho Ivo
Eugênio Marques, que assina a ação (ACP 0020218-02.2013.5.04.0020), também
solicitou à Justiça que ordenasse ao banco para não repetir tal comportamento
com outros empregados em território nacional.
O pedido de indenização original consistia em 10%
do lucro lÃquido do Bradesco nos últimos cinco anos, mas a Justiça concedeu o
montante que equivale a 1% do lucro lÃquido reajustado entre 2008 e 2012. As
custas do processo, com base no valor da condenação, são de R$ 16 milhões,
também a cargo do réu.
À decisão, cabe recurso. Este blog solicitou ao
Bradesco seu posicionamento a respeito da decisão, que será publicado neste
espaço assim que recebido.
Também de acordo com a sentença, o banco nega ter
praticado ato discriminatório e afirma manter uma polÃtica institucional
responsável na gestão de seus recursos humanos que visa a respeitar a dignidade
humana. Diz que os depoimentos colhidos durante o inquérito não servem como
prova porque foram prestados sem compromisso e se tratam de declarações
superficiais. Por fim, diz que outros empregados também foram demitidos no
mesmo dia.
O argumento não foi aceito pela juÃza Adriana
Ledur, da 20a Vara do Trabalho de Porto Alegre, em sua sentença que data de 20
de fevereiro deste ano e foi divulgada, nesta sexta (3), pelo Ministério
Público do Trabalho. A ação foi ajuizada em novembro de 2013.
O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, com
sede em Porto Alegre, já havia reconhecido a conduta discriminatória do banco
(acórdãos 00561-51.2012.5.04.0233 e 663-45.2012.5.04.0017) ao demitir os irmãos
por conta da reclamação do pai, ex-gerente. O banco foi condenado a reintegrar
um deles, além de pagar os salários durante o afastamento e indenização por
danos morais.
Citando as decisões do TRT em ações individuais
movidas pelos empregados demitidos, a juÃza Ledur reconheceu como válida a ação
civil pública do MPT em nome da coletividade, pois, segundo ela, a demissão
impactou o direito fundamental difuso de um cidadão ter livre acesso ao
Judiciário sem sofrer represálias.
'A dispensa arbitrária de dois funcionários
motivada pelo ajuizamento de ação trabalhista repercute na relação do banco com
os demais empregados. Isso porque a conduta do empregador, além de ter o caráter
punitivo em relação à s vÃtimas diretas do ato, possui efeito pedagógico para os
outros funcionários. A penalidade aplicada interfere na atuação dos
trabalhadores do banco, já que os orienta sobre as consequências negativas a
que estão sujeitos acaso decidam procurar o Judiciário e exercer seu direito
constitucional de ação', afirmou a juÃza Adriana Ledur na sentença.
'No caso em exame, observa-se que o agir do banco
tem claro intuito de gerar sentimento de medo em seus subordinados e passa a
clara informação de que o poder da instituição transcende as regras e
princÃpios impostos pela ordem jurÃdica, colocando-se acima do Estado e do
Direito', afirma a sentença.
'A perversidade da polÃtica de repressão adotada
pelo réu, a qual gera sentimento de temor, humilhação, impotência e apreensão
constantes tanto em funcionários como em ex-funcionários que ingressaram ou
pensam em ingressar com ação em face do banco e que possuam familiares
empregados. Mas não é apenas isso: o agir do réu igualmente repercute no
sentimento de justiça no âmago da sociedade, violando valores sociais como a
ética, a igualdade e a equidade, porquanto insinuam à comunidade o que pode
acontecer com quem quer que ouse contrariar os interesses da instituição, ainda
que por meios legÃtimos como o acesso ao Poder Judiciário', proferiu a juÃza.
A condenação obriga o Bradesco a se abster de
promover, praticar ou tolerar qualquer ato discriminatório ou represália, tais
como dispensar, punir, ameaçar, coagir, deixar de admitir, de promover ou de
oferecer cursos a seus empregados em razão do ajuizamento de ação por eles ou
por seus familiares, sob pena de multa no valor de R$ 50.000,00 por cada
violação e por trabalhador atingido.
Durante as investigação sobre as demissões, o
Ministério Público do Trabalho verificou que o Bradesco também estava
realizando promoções sem que o empregado recebesse simultaneamente os devidos
aumentos de salários e benefÃcios, apenas tendo que arcar com as novas
responsabilidades e obrigações. Segundo a sentença, as provas testemunhais
produzidas pelo próprio banco durante o processo confirmam a situação.
A Justiça acatou a demanda e o banco deverá pagar a
todos os atingidos no processo as diferenças remuneratórias e as vantagens de
novo cargo devidas com retroatividade a partir de novembro de 2008. E obrigou o
banco a adotar a não adotar essa postura com outros casos daqui em diante:
'condeno, pois, o réu em obrigação de fazer consistente em sempre que atribuir
funções ou alterar as funções já exercidas pelos seus funcionários pagar e
conceder, imediatamente ou retroativamente, o acréscimo salarial correspondente
e os demais direitos decorrentes do exercÃcio de funções do novo cargo ou das
novas atribuições, sob pena de multa no valor de R$ 50.000,00 por cada violação
ou trabalhador atingido'.
A Justiça também ordenou, atendendo a pedido do
MPT, que o banco dê publicidade à sentença em três jornais de circulação
regional em cada Estado do paÃs, em três ocasiões distintas.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho, a
instituição alertou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre a omissão do
banco em informar da ação judicial que pode leva-lo a perder parte de seu lucro
lÃquido. Contudo, a comissão teria considerado que não havia necessidade, até
aquele momento, de publicar um 'fato relevante' ao mercado.