Se Luiz Inácio Lula da Silva era a última cartada do governo Dilma
Rousseff para tentar escapar do impeachment e do atoleiro econômico, ela durou
pouco mais de seis horas. E, de quebra, acelerou a já vertiginosa dinâmica da
crise rumo a um perigoso desconhecido.
Recapitulando. Lula começou a quarta-feira (15) negociando os
termos da rendição do poder presidencial de Dilma para si, após ter ouvido o
rugir dos mercados e o chiado de um quase demissionário presidente do Banco
Central.
À tarde, a presidente em modo "emérito" fez ampla defesa
da escolha e negou que Lula estivesse se abrigando do juiz Sergio Moro.
Poucas horas depois, transpareceu o pacote de grampos legais que
não só desnudam Lula na intimidade, mas em plena operação por seus interesses –
e recebendo "em caso de necessidade" o termo de posse que poderia
livrá-lo de uma visita da Lava Jato curitibana.
O que veio a seguir foi uma explosão espontânea das ruas, que
desafiará o discurso palaciano de que manifestações como a de domingo são
isoladas. As pessoas saíram do trabalho ao protesto.
O governo irá se apegar à versão apresentada à noite, mambembe mas
de contraditório probatório quase impossível, e à suspeita de que o diálogo
Dilma-Lula possa ter sido gravado após o fim da ordem judicial para tanto.
Em ato que alimentará a acusação de que age com "timing"
político, Moro venceu por duas horas a corrida com o Planalto: se Lula fosse
ministro, o sigilo do caso não poderia ser levantado. Isso poderá ser visto
como afronta ao Supremo, que deteria o poder sobre tal decisão.
Politicamente, o estrago está feito. Em especial para Lula, cuja
lendária soberba e vulgaridade no trato interpessoal se espalha pelos diálogos.
Se o mito já estava trincado pelas revelações recentes, o conjunto recolhido
parece quebrar os pés da efígie.
Não há condições políticas para a volta de Lula ao governo, ainda
que Dilma já tenha avisado que a posse está marcada para esta manhã – na
prática convidando protestos. A crise atinge assim um novo paroxismo.